O meu amigo/irmão Flávio Prado depois de 31 anos está deixando a apresentação do lendário programa "O MUNDO DA BOLA", uma marca histórica da Jovem Pan. O programa passará a ser exibido na nova TV Jovem Pan, que entrou no ar há poucas horas com muito sucesso. O novo formato comandado pelo jovem promissor Geovani Chacon e pelo rodado e excelente José Manoel de Barros estreia no próximo fim de semana. Flávio deixa um legado maravilhoso para a Rádio e para os ouvintes da Jovem Pan, onde continuará, é claro, como comentarista nos programas esportivos e nas jornadas de futebol.
Eu tenho grande respeito e admiração por Flávio Prado profissional e pelo grande ser humano que é. O cara é a essência do jornalismo. Faz tudo bem feito. É grande comentarista, grande apresentador, é estudioso, é escritor e nas horas vagas por muito tempo foi professor e pelo que sei dos bons. Ainda outro dia eu ouvi elogios para ele de nada mais nada menos que o ótimo Reinaldo Gottino. Pois é, ele foi aluno do Flávio Prado e parece que aprendeu muito bem e claro depois desenvolveu seu próprio estilo e hoje é realidade nas tardes de São Paulo com seu Balanço Geral, na TV Record, incomodando a audiência da Globo todos os dias. É um sucesso.
Lembro da chegada do Flávio Prado, na Jovem Pan, para ser âncora, ou algo assim, na TV Jovem Pan, que acabou morrendo no nascedouro, infelizmente. Seu Tuta tinha grandes planos e já saiu mexendo com o mercado ao contratar nomes importantes e dividir o Campeonato Paulista com a Globo e a Bandeirantes. Era ideia dele fazer na TV o que já se fazia com competência na Rádio. Jornalismo e Esportes 24 horas. Tempos depois com o advento das TVs a cabo muito daquilo que seu Tuta pensava para a JP se tornou realidade em outras Redes. De novo ele estava pensando na frente, mas por várias razões não conseguiu realizar seu sonho.
Com a descontinuidade da TV, Flávio Prado, é claro, se fixou totalmente na Rádio e ali ocupou seu espaço. Mas quando chegou fez um pedido especial ao seu Tuta: "Queria fazer um programa sobre futebol internacional", algo raro numa época em que as comunicações eram difíceis com o mundo todo. Só para lembrar, o programa estreou num sábado, 08/09/1990. Era mais fácil se comunicar por sinal de fumaça que por telefone. Claro que estou exagerando, mas é para perceberem como seria difícil fazer um programa de duas, ou três horas, com conteúdo internacional.
Flávio Prado era "pretensioso, empreendedor e atrevido", não necessariamente nessa ordem. Já tinha tentado um programa igual comprando horário na Rádio América, que não tinha tradição em esporte. Durou 3 meses por falta de patrocínio. Mas na Jovem Pan a coisa andou e agradou em cheio. Diria que passou a ser o programa de todos nós. Como diriam os mais jovens, virou Cult. Flávio se virava encomendando jornais internacionais na Banca do Junior, embaixo da Pan, e foi montando uma rede de informantes Mundo afora. Seu Tuta disse que podia fazer o programa que começou com uma hora e depois foi aumentando chegando a ter quatro horas seguidas no ar, mas ele que se virasse com produção e afins. Não se fez de rogado. Vários estagiários apareceram para ajudar.
Flávio sempre se preocupou em trazer as informações do que estava acontecendo fora do país. Na sua passagem pela Record, Bandeirantes, antes na própria Gazeta, onde começou, também era assim. Não era usual para as equipes de esportes essa preocupação a não ser em época de Copa do Mundo ou quando havia jogos da Seleção Brasileira. Era um nicho a ser preenchido. Lembro que Oswaldo Alvarez, o falecido Vadão, se interessou por aquele 3-5-2, que colocou em prática com sucesso no Mogi-Mirim, por causa de uma matéria escrita pelo Flávio Prado. Para ele foi algo inédito que mudou sua vida como treinador. Lá Flávio explicava as funções do esquema baseado no que via e recebia de informação do outro lado do Mundo.
Lembro do Flávio discutindo com Telê Santana, no "Cartão Verde", da TV Cultura, que era comandado por ele tendo Juca Kfouri e José Trajano na bancada, um trio clássico. Telê tinha tido o desplante de mandar um time reserva para jogar com o Criciúma pela Libertadores poupando os titulares para um jogo de Campeonato Paulista, que na época a bem da verdade se rivalizava com o Brasileiro, ou seja, era muito mais importante e mais forte que hoje, mas Flávio não aceitava que os times brasileiros preterissem à Libertadores, que era um torneio que poderia colocar a cara dos clubes na mídia internacional.
Foi a partir daquele dia que a diretoria do São Paulo se viu convencida que a Libertadores era algo maior e que valia a pena ser levada a sério. Até o teimoso Telê Santana capitulou e foi através da Libertadores que conquistou o Mundo. O torcedor sãopaulino hoje se identifica com a competição e os demais clubes também. Antes Santos, Cruzeiro e Flamengo já tinham conquistado, mas não se preocuparam em dar continuidade. Vale dizer que também só participavam o campeão e o vice do Brasil, mas mesmo assim Santos e Palmeiras chegaram a abrir mão da competição. Se hoje a Libertadores tem esse peso para os times brasileiros deve-se muito ao Flávio Prado, que brigava para que dessem a atenção devida à competição.
O Mundo da Bola tem a ver com tudo isso. Com o tempo se transformou num programa que falava também de variedades e trazia matérias de outros segmentos. Lembro de uma com a Vanusa falando de sua vida com o Antonio Marcos, que foi espetacular. Entre tantos outros momentos como as comemorações dos aniversários do programa com festa e participação de artistas, convidados e gente da bola. Foi um sucesso imenso.
Foi também no Mundo da Bola que aconteceu a primeira entrevista via celular, ou através do pai do celular atual. O falecido Dirceu jogava no Napoli e combinou uma entrevista com Flávio Prado para o programa do sábado. Quando ligaram na casa dele, cadê Dirceu? E agora? A esposa dele resolveu rápido. "Não tem problema, liga para esse número, é o telefone que ele tem no carro. Ele te atende". Como assim?. Era algo impensável para a época, hoje é normal. Flávio conversou muito com Dirceu sobre futebol e já que ele estava dando uma volta pela região o transformou no primeiro repórter internacional de trânsito da Jovem Pan; "E aí, Dirceu? Em que rua você está, me conta como está o trânsito, vai pegar estrada, chove, faz sol, tem pedágio, qual a dica para um brasileiro que queira viajar para a Itália?". Foi matéria de jornal no dia seguinte tal era a novidade.
Esse é o Mundo da Bola, que foi comandado por Flávio Prado de 8 de setembro de 1990 a 1 de Outubro de 2021. São 31 anos. É uma vida que mudou tantas vidas. Ele deu chances para vários profissionais que hoje seguem fazendo sucesso e que falaram pela primeira vez num microfone no Mundo da Bola. Ha dezenas deles, talvez eu esqueça muitos e peço perdão, mas de cabeça tem Fábio Seródio, meu companheiro de Futebol em Rede; Everaldo Marques, hoje na Globo: Felipe Mota, nos Canais Dysney; Cris Santos, na TV Bandeirantes; André Ranieri, na Energia 97: Fred Junior, na Rádio Craque Neto e por muito tempo na mesma Jovem Pan; Luciana Ferreira, Paulo Vinicius Coelho, o PVC, hoje na Globo, Wagner Lima, Fernando Fontana e Alex Fogaça, ambos na Rede TV e tantos outros que tiveram essa escola maravilhosa com o professor Flávio Prado.
Além dos meninos sentindo o gosto de começar a carreira tinha o genial Reali Junior, de Paris; o não menos genial Cládio Carsughi; Martins Araújo, com o futebol português; O grande Roberto Petri, com o futebol argentino; Jairo Walace, tradutor de Mirandinha no Newcastle; Fábio Guerra, com futebol uruguaio; Loly Gianfranco, um argentino maluco bom de papo, entre tantos outros.
Ás vezes nós da equipe de esportes nos metíamos a participar também. Lembro de uma vez que coloquei o então diretor da Parmalat, José Carlos Brunoro, na escuta do Flávio Prado na véspera de um daqueles jogos no interior e descobrimos que o Palmeiras estava contratando Müller. O Flávio fez uma pergunta sobre um outro jogador e Brunoro citou Müller na resposta. Aí gente gritou: "Opa, notícia nova, você está contratando Müller?". Ele começou a rir sem parar, não conseguiu desmentir. Ou seja, os anjos também adoravam o programa e estavam sempre de plantão.
Num sábado pela manhã, o sisudo Telê Santana estava assistindo um bate bola no treino do São Paulo e acreditem, naquela época repórter via treino e entrevistava um monte de jogador ali mesmo no gramado. Mas Telê era chato, não falava na véspera de jogo. O Milton Neves brincava com o Flávio que ele tinha um Maverick todo velho, que só pegava no tranco, e todo mundo entrava na "palhaçada". Até os ouvintes, mas resolvemos dar o troco no Milton. Cheguei no seu Telê, que já foi querendo sair: "Hoje eu não falo com ninguém" e eu: "Calma, seu Telê. A gente quer "sacanear" o Milton Neves, o senhor quer participar da brincadeira?"
Os olhos do Telê se iluminaram. Nisso o assessor de imprensa, que já existia, vinha para cortar a conversa e ele: "Calma, calma, fica tranquilo, está tudo certo" e emendou: "Como é isso?". "Ah, a gente está dizendo que nas horas vagas ele está fazendo Balé numa academia perto da rádio". Topou na hora. Ele mesmo criou o texto para "cutucar" o Milton: "Oi, Milton, aqui é o Telê. Preciso de um favor seu. Olha, eu queria que me indicasse a Academia onde você está fazendo Balé para minhas netas. Sei que você está com todos os passos em dia, rodopia que é uma beleza com uma sapatilha brilhante" e depois ficou jogando conversa comigo mais de meia hora. Dizem que o Milton é tão esperto que acabou fazendo uma permuta e fez as aulas de graça virando um grande dançarino. Mas isso é outra história.
Na verdade, esse textão todo ainda é pouco para citar a influência do "Mundo da Bola" no nosso Mundo jornalístico e particular. São 31 anos de belíssimas histórias e matérias inesquecíveis. Daria para fazer um capítulo, ou mais, para cada ano tal é o conteúdo à disposição. Apesar do textão foi apenas uma pequena parte para homenagear o programa e um profissional de alto valor como Flávio Prado. Desculpem se falei demais. Sei que nos dias de hoje tudo tem que ser muito rápido. Mas nós de Rádio temos a mania de falar muito mesmo. Por isso os programas são eternos.
Parabéns, Flávio Prado e todos que fizeram o MUNDO DA BOLA por 31 anos. Acho que você, Flávio, que com certeza tem um texto melhor que o meu, devia escrever um livro sobre esse programa. No dia do lançamento serei o primeiro da fila para pegar seu autógrafo. Em frente, amigo. Vida que segue. O MUNDO CONTINUA GIRANDO E ESTÁ SUSPENSO NO AR e na memória.
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