top of page
  • Foto do escritorFutebol em Rede

A GENTE TEM QUE ACREDITAR. SEMPRE.



O que seria de nós se não acreditássemos?

 

Ele era um menino de oito anos que adorava o Ademir da Guia. É, aquele gênio que jogou no Palmeiras há muitos anos. Jamais o vira na vida, mas gostava dele, sabe-se lá por quê. O que prova que ele sempre fora um grande palmeirense.

 

Numa noite, pouco antes de dormir, achou que já havia chegado a hora de tomar uma séria decisão em sua vida: assim como todos os meninos de oito anos, decidiu que quando crescesse seria jogador de futebol. Mas não qualquer jogador, desses que jogam em qualquer time. Não: ele jogaria só no Palmeiras, o time do seu coração. Já imaginando os gols que marcaria - porque, claro, seria um fantástico meia, como o Ademir - já ouvia os gritos de "E, ô, e, ô, ele é um terror!". O “ele” em questão era ele, mesmo. Assim, embalado pelo carinho da torcida que lotava o estádio de sua imaginação, dormiu. E sonhou.

 

Sonhou com a o velho Palestra Itália lotado numa decisão de Campeonato Paulista. De um lado, o Palmeiras e sua maior estrela: ele, é claro. Do outro, o Corinthians. O técnico do Palmeiras, Ademir da Guia, conversava com ele antes do jogo: "Cara, você é nossa maior esperança. Você tem que acreditar... Sempre", dizia.

 

O jogo começa e como todo clássico é bastante disputado. O Corinthians joga bem, não se intimida com o campo adversário e sua torcida continua fanática. Aos poucos, o Palmeiras vai equilibrando as ações e o primeiro tempo, embora repleto de emoções, termina empatado em 0 a 0.

 

Durante o intervalo, Ademir o chama para uma conversa particular. Num cantinho do vestiário, o "Divino" fala baixinho, quase sussurrando (aliás, é sempre assim que ele fala, né?). "Você precisa resolver esta partida, meu. Você tem que acreditar... Sempre", disse. Aquela frase ficou na cabeça dele: "Tem que acreditar sempre, tem que acreditar sempre...".

 

Quando o segundo tempo começou, ele queria definir tudo rapidamente. Mas a marcação corintiana o impedia de fazer jogadas mais ousadas. Do banco, Ademir da Guia continuava gritando: "Tem que acreditar! Tem que acreditar!". Só que o jogo continuava igual - nem Corinthians e nem Palmeiras conseguiam chegar ao gol. Nas arquibancadas, a imensidão verde se angustia, pois vê que a prorrogação parece inevitável.

 

Mas, aos 44 minutos, ele recebe um lançamento na intermediária, dribla dois corintianos e leva a bola para a direita. Lá, passa pelo lateral-esquerdo e entra em diagonal na grande área. Desesperado, o goleiro corintiano sai em sua direção, e ele faz então o mais bonito: toca de leve, de três dedos e por cobertura, como se fosse o Ademir da Guia. Gol do Palmeiras! Gol do campeão paulista! Ainda no gramado mas já com a faixa, recebe um abraço do técnico, ídolo e amigo, que mais uma vez, sussurra: "Eu não disse? Tem que acreditar... Sempre".

 

De repente, abre os olhos e não vê mais a torcida. Seu corpo está molhado de suor, mas bem menos do que ao final do jogo dos seus sonhos. Olha para o lado, mas Ademir da Guia não está lá. E a grama macia, onde vibrara de alegria com seus companheiros, era agora o colchão de sua cama. Meio confuso, e preferindo acreditar que tudo não passara de um lindo sonho, levanta-se. Vê seu pai, que já está apressado para o trabalho, e diz:

 

Pai, eu quero ir ao Palestra Itália. Agora?

_ É. Agora.

Fazer o quê? Jogar no Palmeiras.­_ Jogar no Palmeiras? E você conhece alguém lá?_ Conheço, sim, pai. Conheço o Ademir da Guia.­­_ Ah, claro, você conhece o Ademir da Guia..._ É pai. Ele é o técnico do Palmeiras e gosta muito de mim. Ele até já me disse que eu sou o melhor jogador do Verdão._ Filho, eu já falei pra você não ficar vendo futebol até tarde. Daqui a pouco você vai acabar acreditando nessas coisas.

 

Ele baixou os olhos, triste. Seu pai não o levara a sério, não acreditara. Esperou, então, que ele ajustasse o nó da gravata, pegasse a pasta e, quando estava saindo pela porta o chamou novamente, mas só para lembrá-lo:

 

- Pai, a gente tem que acreditar. Sempre.

 

­­­­­­­­­Márcio Trevisan é jornalista esportivo há 35 anos. Escritor com cinco livros publicados, começou no extinto jornal A Gazeta Esportiva, onde atuou por 12 anos. Editou várias revistas, esteve à frente de vários sites, fez parte de mesas redondas na TV e foi assessor de Imprensa da S. E. Palmeiras e do SAFESP. Há 17 anos iniciou suas atividades como Apresentador, Mestre de Cerimônias e Celebrante, tendo mais de 450 eventos em seu currículo. Hoje, mantém os sites www.senhorpalmeiras.com.br e www.marciotrevisan.com.br. Contatos diretos com o colunista podem ser feitos pelo endereço eletrônico apresentador@marciotrevisan.com.br.



 

bottom of page